quarta-feira, 3 de novembro de 2010

A vida de Chico Buarque de Hollanda


A vida de Chico Buarque de Hollanda

Ele já foi considerado 'unanimidade nacional', chamado de 'alienado' pelos tropicalistas e invocado como 'a voz dos exilados brasileiros'. Hoje, é 'apenas' uma referência obrigatória em qualquer citação à música brasileira a partir dos anos 60 e foi eleito recentemente o músico brasileiro do século. Esse é um mero resumo do papel de destaque na música nacional exercido por Francisco Buarque de Hollanda, ou melhor, Chico Buarque. Nos últimos quarenta anos, não há como separar a influência poética, harmônica e melódica de suas composições do amadurecimento da MPB. Chico também fica marcado na música brasileira como o homem que melhor conseguiu compor como mulher. 'Mulheres de Atenas' é uma das pérolas de seu lirismo feminino.
Chico Buarque, atualmente, não é só o compositor de Construção ou o intérprete de A Banda. Ele conseguiu ampliar suas investidas e produzir trabalhos de muita profundidade como poeta e escritor.
Em comemoração aos seus 60 anos, a BMG lança a caixa Francisco, com doze CDs e dois DVDs, reunindo todos os discos de Chico lançados pela gravadora desde que ele passou a fazer parte de seu cast, em 1987.

Berço de ouro

Chico nasceu no dia 19 de junho de 1944, no Rio de Janeiro. Foi o quarto de sete filhos do historiador e sociólogo Sérgio Buarque de Hollanda e da pianista amadora Maria Amélia Cesário Alvim. Com dois anos de idade, mudou-se com a família para São Paulo, onde o pai assumiria a direção do Museu do Ipiranga.
A infância de Chico Buarque ainda seria completada em Roma, para onde foi aos nove anos de idade, quando o pai fora convidado a dar aulas na Universidade de Roma. Na Itália, Chico tornou-se trilingüe, uma vez que estudava em escola americana, conversava com os colegas em italiano e, em casa, falava o português. É no país, também, que começou a escrever suas primeiras 'marchinhas de carnaval'.
A formação cultural do pequeno Chico seria composta, ainda, pelas constantes visitas de figuras importantes do cenário artístico brasileiro, como Vinicius de Moraes, Baden Powell e Oscar Castro Neves, por intermédio de seu pai ou pela amizade à sua irmã mais velha Miúcha.

A volta ao Brasil - a música delineia-se em sua vida

No meio dos anos 50, Sérgio Buarque de Hollanda volta com a família para o Brasil. Chico começa a dar seus primeiros passos no mundo da música, escrevendo pequenas 'operetas', as quais cantava com suas irmãs mais novas Ana, Cristina e Pii.
Os sambas tradicionais de Noel Rosa, Ismael Silva e Ataulfo Alves eram os preferidos do jovem Chico, junto com as canções estrangeiras, que faziam sucesso na época, de artistas como Elvis Presley e The Platters. Mas, sua relação com a música foi definitivamente influenciada por João Gilberto e seu disco Chega de Saudade. Chico dizia que seu sonho 'era cantar como João Gilberto, fazer música como Tom Jobim e letra como Vinicius de Moraes'. Mal sabia o garoto que, algumas décadas depois, ele desbancaria esses grandes nomes e seria considerado o músico do século no Brasil.
Ainda sem se decidir pela música, Chico ingressou em 1963 na FAU - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. Mas, sua turma gostava era mesmo de um bom samba e cachaça e, no terceiro ano do curso, Chico abandonou a faculdade.
Em 1964 aconteceria a estréia de Chico na música, cantando 'Canção dos Olhos' em uma apresentação no Colégio Santa Cruz. O ano seguinte delimitaria, definitivamente, a incursão de Chico Buarque no cenário musical do país com seu primeiro compacto - com a música 'Pedro Pedreiro' - e com o convite de Roberto Freire, diretor do TUCA, para musicar o poema 'Morte e Vida Severina', de João Cabral de Mello Neto. Esse foi um sucesso e, durante excursão pela Europa, a peça conquistou o festival de teatro universitário de Nancy, na França.

Os festivais e o endurecimento do país

Os festivais de música que aconteciam nos anos 60 eram a mostra do turbilhão criativo intelectual e artístico pelo qual o país passava. 
Os compositores escreviam e interpretavam suas músicas fervorosamente. 
Chico tornava-se uma celebridade no país com várias de suas músicas inscritas nos festivais. 'A Banda', por exemplo, foi uma das vencedoras do II Festival de Música Popular Brasileira da TV Record e propiciou o reconhecimento de Chico em várias partes do Brasil e até mesmo do exterior. Carlos Drummond de Andrade chegou a se referir ä música como a marchinha, 'tão antiga em sua tradição lírica', que trazia ao país o amor de que ele precisava. Foi a glória para Chico: com apenas 23 anos, ele conquistava um público diversificado, tinha depoimentos 
gravados no Museu da Imagem e do Som e, segundo Millôr Fernandes,
tornara-se a única 'unanimidade nacional' Enquanto o cenário cultural se voltava para um momento de grande criatividade e qualidade, o país sofria o endurecimento da ditadura.
Às vésperas do AI-5, que instauraria de vez um duro regime militar, os envolvidos na produção cultural eram 'obrigados' a tomar posições.
Enquanto de um lado o tropicalismo propunha um rompimento estético com o belo e uma absorção do que também era considerado feio, a música de Chico tendia para o que ainda era bonito. 
Mesmo suas composições mais nostálgicas declamavam uma alegria contagiante. Chico começou a ser criticado como 'alienado'. Sua música 'Bom Tempo' foi vaiada, pois não era possível falar em dias claros enquanto o céu brasileiro escurecia com a mancha da ditadura. 'Sabiá', uma parceria de Chico e Tom Jobim, recebeu a maior vaia da história dos festivais em 1968 e, mesmo assim, foi escolhida vencedora,desbancando o hino da oposição 'Pra Não Dizer que Não Falei das Flores',de Geraldo Vandré. Mas, a premonitória 'Sabiá' teria seu valor reconhecido tempos depois, quando se tornou um hino dos exilados brasileiros pela ditadura.


O alienado cercado pela ditadura

Chico Buarque promoveu um auto-exílio em Roma, onde a gravadora tinha um plano de divulgação de seu trabalho pela Europa. Lançou dois discos fora do Brasil, que não obtiveram sucesso. Em 1970, voltou ao país e lançou seu quarto LP, marcado por um amadurecimento de seu trabalho. 
Chico deixou de lado o lirismo nostálgico e descompromissado que antes o identificava, e suas letras passaram a transmitir um protesto políticomais duro ao regime ditatorial em que o Brasil estava imerso. 'Apesar de você' registra essa nova fase do compositor. 'Apesar de você/Amanhã a de ser outro dia' dizia a canção em uma referência implícita ao general Emílio Garrastazu Médici, então presidente da República, cujo governo foi marcado pelas mais atrozes barbaridades cometidas contra os opositores do regime.Muitas músicas de Chico começaram a ser barradas pela censura. Como forma de burlá-la, o compositor decidiu criar um personagem heterônimo chamado Julinho de Adelaide, fazendo com que suas canções passassem com maior facilidade pelos censores. A estratégia surtiu efeito e músicas como 'Acorda, amor' e 'Milagre brasileiro' passaram sem maiores problemas. Entretanto, uma reportagem publicada em 1975 pelo Jornal do Brasil desmascarou o verdadeiro Julinho de Adelaide.
 

Por outros mares

Chico Buarque procurou outras formas de artes pelas quais pudesse se expressar. chegou a atuar no filme Quando o Carnaval Chegar (1972), de Cacá Diegues, produzir a trilha sonora de Vai Trabalhar Vagabundo,de Hugo Carvana e escrever o roteiro e as músicas da peça 'Calabar', com Ruy Guerra.Em 1978, Chico conquistou o Prêmio Molière como melhor autor teatral do ano com a peça 'A Ópera do Malandro', com texto e música escritos por ele. Chico também ingressou no campo da Literatura com obras como a novela 'Fazenda Modelo', em 1974, e 'Estorvou', em 1991. Os anos noventa se anunciaram como um divisor de águas para parte daqueles que fizeram a MPB dos anos 60 e 70. Chico, Caetano e Gil foram segmentados e o popular perdeu a dimensão desses artistas, fazendo com que suas músicas ficassem voltadas para uma pequena parcela da população brasileira de classe média. 


CURIOSIDADES 


 *Chico é apaixonado por futebol e torce freneticamente para o Fluminense. Entretanto, seu ídolo no esporte vestia a camisa alvinegra do Santos: o número 9 Paulo César de Araújo, o Pagão. Até hoje, quando joga pelo seu time Politheama, Chico veste a camisa nove em homenagem ao jogador.
 * Quando jovem, Chico gostava de ler os clássicos da literatura francesa, alemã e russa e só se interessou  pela literatura nacional quando um colega de escola o criticou por ler apenas livros estrangeiros. 
 * Chico Buarque envolveu-se com um grupo ultraconservador da igreja chamado 'Ultramontanos'. 
 * Chico foi casado com a atriz Marieta Severo com quem teve três filhas: Sílvia, Helena e Luiza. Em 1997, após trinta anos de união e boatos de casos extraconjugais de Chico, o casal se separou.


Nenhum comentário: